Morte por clima

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Verifico com uma curiosidade tristonha o quanto a maioria dos problemas de nosso tempo não representam uma preocupação real para muitas pessoas.
Espécies estão entrando em extinção? Tudo bem, tem outras… (Até quando?)
Haverá uma guerra nuclear? Não tem problema, estou longe… (Mas as massas radioativas viajam.)
Estão havendo muitos efeitos da mudança climática extrema? Os cientistas acabam dando um jeito… (Até que atinjamos um ponto no qual não haja mais volta.)
Algumas pessoas escolhem decidir que se trata de uma questão de opinião. Mas qual é a opinião que eu posso ter se vejo uma pessoa assassinar um pai na frente do próprio filho? Talvez nós possamos esperar mais um tempo até que ele se reeduque por conta própria?
Há questões que nos obrigam um certo nível de reflexão. E a reflexão nos leva a aumentar o nosso engajamento ou não em determinadas ações.
Vamos pensar em uma escala de engajamento. Se zero é absolutamente nada engajado e dez é totalmente engajado, qual é o seu nível de engajamento? Ou seja, quando eu falo que as mudanças climáticas estão causando sérios problemas, qual é o seu nível de preocupação a ponto de tomar alguma atitude a respeito?
Se você passa a utilizar etanol ao invés de gasolina, passa a separar o lixo para a reciclagem, ou qualquer atitude do gênero, indica algum engajamento com o assunto. Então, de zero a dez, qual é o seu nível de engajamento? Eu realmente quero que você pense em um número de zero a dez e lembre-se dele até o final deste artigo.
Esta autoavaliação foi uma introdução para você entender se já está trabalhando pela sua saúde e, portanto, para a saúde pública ou, caso contrário, se vai passar a trabalhar a favor.
Paulo Saldiva, médico patologista e professor titular da USP faz uma analogia interessante quando fala da maior cidade da América do Sul: São Paulo é uma senhora de quase 470 anos, paciente com comorbidades severas e cuja probabilidade de morrer aumenta em 50% quando uma onda de calor faz com que a temperatura da cidade passe dos 30 graus celsius.
Pode não estar escrito MORTE POR CLIMA no atestado de óbito, mas é exatamente o que tem acontecido com muita gente. E esses números vão aumentar.
A estreita faixa de temperatura adequada para a cidade de São Paulo é de 18 a 27 graus celsius. Ele explica que, em São Paulo, quando a temperatura passa dos 30 graus, temos um aumento de 50% no número de mortes. E do que as pessoas morrem? Ao transpirar, o sangue pode se hemoconcentrar e causar trombos em órgãos vitais. A consequência é que aumentam as chances de infecção respiratória.
Os bairros de São Paulo são como os órgãos e nós somos as células desta senhora que engordou muito e irregularmente ao longo dos anos. Ela tem trombos metálicos em sua estrutura e sofre de diarreia em seus rios.
Claro que, além do engajamento pessoal para melhores hábitos e práticas no dia-a-dia, há de se ter um maior e melhor engajamento das forças políticas: Saldiva explica que, na medida em que o local é mais pobre, o risco de internar muda. Até a capacidade de se defender muda: é mais barato comprar um casaco do que manter um ar-condicionado. E o cidadão, sozinho, não consegue reflorestar a própria rua.
As mudanças climáticas também influem na saúde mental com consequências nas doenças cardiovasculares, respiratórias e renais. Além disso, há artigos que relacionam a mudança da curva da temperatura com o aumento de suicídios, violência autoinflingida e homicídios.
Todos nós queremos ter uma vida com realizações e motivos para nos alegrarmos. É natural. É saudável. Porém, precisamos entender que, assim como fazemos alguns pequenos sacrifícios para educar os filhos e jovens, precisamos fazer pequenos investimentos que, ao longo dos anos se somam cumulativamente em nosso corpo e espírito. E, da mesma forma, se somam ao das outras pessoas para a sociedade.
Ou, seja, se queremos que esta velha e fantástica senhora comece a melhorar os seus sintomas, cada um de nós, as suas células, precisamos fazer a nossa parte.
E então, do começo deste artigo até aqui, quanto aumentou o seu nível de engajamento?

Seja feliz e tenha tempo para as pessoas que você ama!

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